Fortuna Critica

Tinha um romance no meio do romance

Leonardo Brasiliense


Cláudio B. Carlos
Escritor e editor
balaiodeletras.blogspot.com.br, em 07/12/2017.

Acabo de ler, de uma só botada, o novo romance de Leonardo Brasiliense. Roupas sujas, dizem por aí, é seu segundo livro de fôlego – começaram a contar em Decapitados (2014). Minha contagem é diferente: incluo na lista o Três dúvidas (2010 – Prêmio Jabuti e Prêmio Livro do Ano da Associação Gaúcha de Escritores), o Whatever (2009 – selecionado para o PNBE 2011 e finalista do Prêmio Livro do Ano da Associação Gaúcha de Escritores) e o Sofia e Mônica (2014).

Roupas sujas apresenta uma proposta interessante e muito bem realizada. O livro, dividido em três partes (“Antônio”, “Valentina” e “Pedro”), tem um romance dentro do romance. Ok, isto já foi feito. Mas tão bem? A primeira parte (“Antônio”) é o livro dentro do livro. As duas outras são o complemento necessário para o bom entendimento da estética sugerida pelo escritor.

Texto gostoso, levemente regionalista (principalmente na primeira parte). Ah, o regionalismo! O que seria da Língua sem ele? Quem trabalha com o regionalismo, o faz em favor da Língua – para mantê-la viva. Viva!

“Meu pai teve oito filhos. Aquilo na roça, e na época, era necessário. Um empregado custava caro, um meeiro exigia dividir a colheita. Filhos, portanto, eram riqueza, e todos tinham função. Os homens crescidos trabalhavam na enxada, as mulheres tocavam a casa. Os mais novos, inocentes, precisavam sobreviver – só um não conseguiu. E nós, os do meio, fazíamos coisas menores: Valentina, que tinha doze anos, cuidava do caçula, ainda um bebê, e eu, homenzinho já com oito, limpava as armas todas as semanas.”

Em 2015, quando escrevi sobre Decapitados, afirmei: “A escrita de Leonardo Brasiliense está madura, consistente – escrita de quem sabe o que faz.” Repito agora, ao falar sobre Roupas sujas.

“Jamais gostei da expressão ‘os desígnios de Deus’. Minha religiosidade precária me faz pensar que Deus não planejou detalhadamente nos tirar a mãe tão cedo e tudo o que veio depois, desde o casamento extemporâneo de Maria Francesca, o pé de Estevam, até o destino de nosso pai. E esse mesmo sentimento religioso minguado me permitia crer que Deus me daria uma segunda chance de ter uma família… confesso que não encontro o adjetivo.”

É obra para ser relida – e será. Recomendo. Boa leitura!

 

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